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Leitura, sono, janela e mofo

Quando eu tento ler, eu pego no sono. Se tento dormir me sacudo por uns vinte minutos e depois acabo dormindo.

Mais e mais da minha vida eu passo no meu quarto. É assim já tem uns anos, e isso me fez apreciar a vista de uma janela.

A janela precisa mirar pra qualquer coisa, exceto uma parede, pra ser o bastante.

Num quarto sem janelas se passa metade do tempo dentro de si, sendo o cérebro, sendo egoísta, pensando. A outra metade se passa angustiado com as paredes, com o fechamento. É a pressão do si mesmo que tenta escapar, bate nos cantos e volta.

Num quarto com janelas, se passa metade do tempo dentro de si, e a outra metade dentro de si, mas pra fora.

Olhar pra rua é diferente de olhar pra uma demão de tinta. Quando olhar pra algo que te prende, repare como os detalhes ficam fortes. Eles dizem "somos nós que te impedimos de estar lá fora, deitado ao sol". A imaginação corre solta, mas ela é fugitiva. Ela queria poder dar uma escapadinha, uma caminhada ao redor da quadra.

Quando olhar pra rua, repare que você fica confortável dentro de si. A rua, e todas as suas possibilidades, estão lá fora. Parecem toscas, até, num dia de sol. É pouco atrativa na medida que for mais concretada, mais asfaltada, mais cheia de pessoas dentro de carros. É mais bonita conforme for mais recheada de árvores, arbustos e cantos com sombra.

Mas a rua não te faz querer sair correndo e descer lá embaixo. Por que só de olhar pra fora já satisfaz, e você fica muito bem dentro de si mesmo.

Mas a janela mirar pra uma parede, aí ela se torna a crueldade aberta no tijolo. A minha janela dava num muro. Com a janela aberta, debruçado com a bacia meio montada no peitoril, meu braço esticado quase alcançava a tinta gasta daquele muro. Ele era mofado e tinha um cheiro úmido de coisa gasta. E ele me fazia querer muito, mas muito, sair correndo pra fora de casa.